O diagnóstico dos problemas urbanos do Rio é praticamente o mesmo entre os especialistas e pesquisadores. A cidade tem nada menos que 22% de sua população vivendo em favelas; 33% dos cariocas vivem na informalidade, sem condições de declarar renda e, por isso, sem conseguir crédito até mesmo para comprar uma casa própria. A falta de financiamento também contribui para um déficit habitacional da cidade estimado em 312 mil moradias. A cidade tem atualmente cerca de mil favelas, sendo que cem delas surgiram nos últimos 20 anos. Com o crescimento das favelas, aumenta a dificuldade de o estado fornecer serviços básicos, como o de saneamento. Cinquenta e sete por cento da população carioca vivem em áreas dominadas pelo crime organizado (tráfico e/ou milícia).
Essas e outras questões serão debatidas em painéis do FITS Urbanismo 2024, o seminário organizado pelo FITS (Fórum Global de Inovação e Tecnologia em Sustentabilidade), em parceria com o Crea-RJ (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado do RJ) e o CAU/RJ (Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Estado do RJ). O evento será na terça-feira, dia 20 de agosto, a partir das 9h, na sede do CAU, no Centro (Av. República do Chile, 230 - 2º andar), o evento tem conexão com os ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis, da ONU. Patrocinado pela Cedae, o Fórum visa ser um ambiente de fomento à inovação e à tecnologia, com atenção ao processo produtivo, à competitividade e ao desenvolvimento sustentável dos espaços urbanos em suas três dimensões: ambiental, econômica e social.
“O FITS Urbanismo trará abordagens distintas, mas integradas, do urbanismo no Rio de Janeiro, com debates sobre saneamento, energia, habitação e mobilidade. Experiências e conhecimentos locais alinhados aos ODS Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Situações vivenciadas em nosso dia a dia que reverberam para todo o país e para o mundo. Serão 25 palestrantes que pensam e fazem urbanismo no RJ compartilhando suas vivências e trazendo a visão do desenvolvimento do espaço urbano de forma sustentável ambiental, econômica e socialmente, com inovação e tecnologia”, explica Lúcia Martins, diretora-executiva do FITS.
Presidente do Crea-RJ: “Nos últimos 20 anos, a Rocinha dobrou de tamanho”
O presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio (Crea-RJ), o engenheiro civil Miguel Fernández, ressalta que é a primeira vez que é realizado no Rio um evento em conjunto com o CAU/RJ, fruto de um termo de cooperação firmado entre os dois conselhos profissionais em 17 de janeiro, logo depois que Fernández assumiu a presidência do Crea.
“Só por isso, já é um marco. Os temas que estão sendo discutidos sobre a questão urbana, ainda mais num momento eleitoral como o de agora, são fundamentais para o desenvolvimento da cidade. Vou dar destaque para a questão da habitação e das favelas. Mas há outros temas relevantes, como a questão do saneamento. Queremos que esses temas sejam incluídos nos programas dos candidatos à prefeitura do Rio”, assinala o presidente do Crea-RJ.
Fernández defende que se repense as políticas públicas sobre urbanização de favelas no Rio, que já têm 40 anos e não conseguem organizar o crescimento das favelas na cidade.
“Precisamos fazer uma autocrítica. São 40 anos de políticas públicas sobre urbanização de favelas com propostas de forma que nesses 40 anos as favelas só crescem, gerando problemas sociais, urbanos e de saúde pública”, afirma Miguel Fernández, observando que “a questão do problema habitacional nos grandes centros urbanos é histórica”.
“O Rio de Janeiro tem a primeira favela do Brasil, a do Morro da Providência, que fica numa área bastante visada pelo poder público, que é a região do Porto”, lembra Fernández.
“Há 40 anos os projetos que vêm sendo abordados em relação às favelas é o mesmo. Qual o resultado alcançado até agora? É uma expansão cada vez maior dessas áreas. Nos últimos 20 anos, a Rocinha dobrou de área ocupada, o que pode ser verificado por meio de fotografias feitas por satélites, unindo-se à Favela do Vidigal. Então temos que discutir se de fato esse é o modelo habitacional que nós desejamos para a nossa cidade”, destaca o presidente do Crea-RJ, para quem um case de solução habitacional é o conjunto da Cruzada São Sebastião, no Leblon, onde o IPTU mais caro do Brasil está em torno daquela solução habitacional que foi dada naquela área, entre Leblon, Ipanema e Lagoa.
“A gente não defende remoção, mas requalificação do espaço que entenda a lógica de viver em comunidade, como acontece na favela, mas que pode avançar e mudar a história do Brasil”, observa Fernández.
Presidente do CAU/RJ: “Há uma descontinuidade nas políticas públicas de habitação e urbanismo no Rio”
O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio (CAU/RJ), arquiteto e urbanista Sydnei Meneses, ressalta que o que falta nas políticas públicas de habitação popular e urbanismo do Rio “é continuidade”.
“As políticas do setor são implementadas e depois abandonadas; isso tem sido cíclico. Os governantes iniciam as obras, depois as abandonam. Essa é a principal causa da falência dessas políticas públicas habitacionais e de urbanização do Rio. Com isso, aumenta o déficit habitacional, o crescimento desordenado das favelas, assim como as doenças provenientes da falta de saneamento básico”, afirma Sydnei.
Com uma experiência de 40 anos como arquiteto e urbanista do município, o presidente do CAU está convencido de que a falta de continuidade tem sido a principal causa dos problemas de habitação e urbanismo.
“Foram gastos rios de dinheiro na urbanização de favelas. Tenho o exemplo concreto da Favela da Rocinha, que tinha um excelente projeto de urbanização no governo Rosinha, que jamais foi implementado. O teleférico que foi construído no Complexo do Alemão, no governo Cabral, consumiu recursos do PAC e está parado”, destaca Sydnei.
Presidente do IPP: debate sobre urbanismo segue a Agenda 2030
Para o presidente do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos, o arquiteto Manoel Vieira Gomes, “discutir o urbanismo é algo muito importante para arquitetos, urbanistas e engenheiros” porque esse debate possibilita maior otimização dos recursos públicos disponíveis para a execução de projetos essenciais para a melhoria da qualidade de vida numa cidade. O IPP é um órgão público que tem ferramentas de monitoramento que ajudam a orientar o crescimento urbano.
“A questão da mobilidade urbana, da habitação social, do déficit habitacional, tudo é muito importante para pensarmos a cidade como o lugar onde a gente vive e trabalha”, afirma Manoel, lembrando que um dos maiores desafios dos governantes hoje é o crescimento vertical e horizontal das favelas, que vem sendo monitorado desde 2009. Até novembro, o IPP deve divulgar novo levantamento com o índice de crescimento das favelas do Rio. Muitas delas tiveram baixo crescimento horizontal, mas alto crescimento vertical. Esse processo tem sido constatado no aumento dos negócios imobiliários das milícias, algo que não tem sido incluído no Plano diretor do Rio, que foi atualizado em 2022.
Manoel ressalta que o debate sobre urbanismo está diretamente relacionado à Agenda 2030 da ONU, um guia e um plano de ação para colocar o mundo num caminho mais sustentável até o ano de 2030. O presidente do IPP lembra que isso requer mudança de paradigmas, que podem ajudar as cidades na descarbonização do meio ambiente, que são a principal causa das mudanças climáticas que têm afetado todos.
“É preciso mudarmos radicalmente o comportamento social e individual”, defende Manoel.
Sobre O FITS
Realizado desde 2018, é um ambiente de fomento à inovação e à tecnologia, com atenção ao desenvolvimento sustentável em suas três dimensões: ambiental, econômica e social. Espaço de diálogo, de avaliação de cenários e de construção de rumos a partir da interface de atores distintos. Empresariado, governo, Nações Unidas, investidores, governos de outros países, órgãos de fomento, instituições de pesquisa e desenvolvimento, academia, empreendedores, sociedade, todos juntos em prol do desenvolvimento. Aborda os desafios e oportunidades à luz do cenário global relacionados a essas questões e possibilita amplo debate com agentes nacionais e do exterior. Contribui para a cadeia de inovação, por meio da disseminação de conceitos, processos, tendências e tecnologias alinhados à cultura da sustentabilidade. Promove o diálogo, a integração e cooperação dos stakeholders das áreas afins à sua temática e propicia troca de informações, experiências e conhecimento, por meio de debates, interfaces e apresentações, ao longo de sua realização. A visão local alinhada à global, em prol da inovação, tecnologia, sustentabilidade e desenvolvimento humanos.
O Fórum conta com o apoio institucional de mais de 150 instituições do Brasil e do exterior, todas representativas em seus segmentos e atuantes em prol dos seus três eixos de atuação. Ao longo de suas 12 edições, de 2018 a 2023, em formato presencial e/ou on-line, atraiu cerca de 2.900 participantes presenciais e 23.100 virtuais. Foram ambientes de amplo debate com 524 renomados palestrantes do Brasil e do exterior (Alemanha, Argentina, Canadá, Chile, Colômbia, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, Irlanda, Itália, México, Moçambique, Noruega, Portugal, Reino Unido e Suécia). Contaram com 162 sessões, entre painéis, palestras e apresentações de casos, que abordaram temáticas como arquitetura financeira e investimentos sustentáveis; produtividade; competitividade; ESG; água; clima; energia e transição energética; bioeconomia; recursos naturais; descarbonização; regulação; concessões; PPPs; agro; cidades inteligentes e sustentáveis; direito; mobilidade e logística; saneamento; transformação digital; ambientes de inovação; empreendedorismo; conectividade; infraestrutura; educação; diversidade e inclusão; acessibilidade; esporte; gestão de resíduos; logística reversa; economia circular; economia azul; impacto social; liderança e gestão.
Fonte: Assessoria de Imprensa do FITS